24 fevereiro 2007

Política pública não pode ser só marketing!

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail:
moraes@fmanha.com.br
Virou moda. Já vi projetos, alguns até interessantes, em que os gastos com publicidade, igualavam, ou mesmo superavam, o dinheiro público investido com retorno direto, para o cidadão-contribuinte. Com o tempo, as políticas públicas avançaram para a necessidade de serem avaliadas no quesito de sustentabilidade. Nesta avaliação passou a ser levada em conta, desde a observação da sua repercussão ambiental, como a social e mais raramente, até, a necessidade dos projetos, se sustentarem, sem o financiamento permanente e muitas vezes, paternalista do estado.

Tem projeto que custa pouco e produz muito em resultados; como há também o inverso: projetos que são caros, mas imprescindíveis, no tempo, no espaço e nas comunidades, onde são implantados. Não sou contra o gestor usar, os instrumentos de mídia, para informar aos cidadãos contribuintes ou, apenas recebedores (ou assistidos pelo poder público), o que anda fazendo com o seu dinheiro e com a representação, delegada pelo voto do cidadão. O que se questiona é o valor despendido em campanhas, que às vezes, além de muito ruins, são também, pouco esclarecedoras.

Interessante ver, que em nosso país, quem estudou administração pública, raramente tem oportunidade de aplicá-la na prática, enquanto na prática se vê, muitos – talvez, a grande maioria - que poderia ter o auxílio de pequenas informações e capacitação em gestão, para tornar mais eficiente a máquina pública e não o fazem. Não sou adepto da tecnocracia e valorizo, ao extremo, a participação do cidadão-simples, na formulação, gestão e também, na avaliação das políticas públicas implementadas pelos que detém, o poder de fazer, em nome de todos.

Voltando à teoria, com ela aprendi, quase que a partir de uma demanda real, que as políticas públicas, se estruturam em programas, depois se desdobram em projetos e finalmente se transformam em ações, mesmo que seus planejadores e executores não saibam disto.

Mais recentemente, muitos gestores passaram a adotar a gestão de projetos em áreas, chamadas de horizontais, ou que envolvem duas, ou mais setores da administração pública, num modelo que é mais matricial e menos hierárquico, mais democrático e menos autoritário, com resultados bastante interessantes, mas ainda há muitos resistentes a tudo que abale, um pouco que seja, a estrutura de poder de pequenos tecnocratas, ou mesmo de medíocres representantes políticos.

É preciso separar o joio do trigo. Infelizmente, hoje, a maioria dos gestores públicos ignora estas questões e usa (usam) única e exclusivamente, a questão eleitoral como definidores das suas prioridades e aí perde (perdem) a oportunidade de avançar na gestão da coisa pública.

Outros tecnocratas olham a gestão pública, como ineficientes por natureza e aí partem para as terceirizações desenfreadas, as privatizações, as concessões e mais recentemente, as chamadas PPPs (Parcerias Público Privada). O argumento, quase sempre é a da falta de recursos para atendimento de determinadas demandas, que os setores privados, que se sustentam como tal, pelo direito ao seu lucro, se dispõem fazer.

Mais uma vez deixo claro, que não sou em si, contra a idéia, mas insisto na tese, que estas concessões precisam ser reguladas e administradas transparentemente, por conselhos e/ou agências reguladoras. Falo de regulação e não de arrecadação. É bom e oportuno, que isto fique claro.

Depois de todo este blá-blá-blá, volto ao primeiro tema, apenas no desejo de que o cidadão esteja mais atento e preparado para entender, que política pública não é marketing e que os resultados precisam ser reais e não artificiais.

PS.: Nos sexto parágrafo, está entre parênteses, os erros de concordância corrigidos da versão original impressa, que publicada na Folha da Manhã em 23-02-07.

16 fevereiro 2007

Angela

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail:Moraes.rol@terra.com.br

Conheci Angela através de Cristina, sua irmã e minha colega de trabalho no Cefet. Elas eram parecidas. Sempre estavam agitadas como que, a esperar ou buscar uma novidade. Angela agia assim por profissão, Cristina por fé. Pensando nestas duas simpatias com quem tive a sorte de conviver em amizade acabo descobrindo, que é exatamente a profissão e a fé que unia ainda mais, estas duas criaturas que nesta vida vieram se ajudando.

Conheci Angela como jornalista, antes ainda de ser também colunista. Dona de um texto objetivo sabia separar a verdadeira notícia, dos detalhes. Assim se transformou na excelente colunista de faro apurado. Angela era amiga dos amigos e profissional com os demais.

Vibrava com as boas notícias. Recordo-me do dia que lhe falei em primeira mão, da oficialização pelo Ministério da Educação, da transformação da então, Escola Técnica Federal, em Cefet. Sua vibração misturava a novidade da notícia, com a satisfação de ver algo de Campos crescendo e fazendo sucesso. Reclamava quando a gente demorava a ligar para conversar. Aprendi com ela a me comunicar, repassar e receber informações.

Tinha uma outra especificidade: fazia coluna social moderna, indo a poucos eventos, especialmente, os noturnos. Dizia que depois das dez horas, ela virava abóbora e já estava dormindo. Substituía os contatos destes eventos com uma capacidade sem igual, em usar o telefone.

Angela era eclética nas suas relações profissionais e pessoais indo do rico, passando pelo remediado até ao pobre, sem perder a autenticidade e sem ser superficial. Era profissional no jornalismo sem esconder as suas preferências no campo das idéias e até da política, algo quase impossível para a categoria dos colunistas, que é hoje, a coqueluche dos jornais. Reagia a outras mídias, gostava da palavra impressa. Gostava de um bom texto.

De vez em quando comentava sobre os meus. Eu sempre considerei coisa de amiga, até quando ela me ligou, para dizer, no dia seguinte a da final desta última Copa do Mundo, que tinha chegado à redação da Folha da Manhã disposta, a desabonar o Zidane pela sua cabeçada, mas que havia mudado completamente sua opinião, depois de ler um artigo extemporâneo meu, sobre o assunto. Fez questão de dizer isso sabendo, que esta é a glória de quem escreve alguma coisa: refazer opiniões, coisa que ela fazia diariamente na sua coluna, ao propor o repensar de questões sob uma ótica diferente.

Porém, mais que tudo isso, Angela era forte. Assimilou com coragem a partida da irmã e depois do sobrinho, na consciência, de que nossa trajetória por aqui tem caminhos traçados em planos difíceis de serem entendidos, mas fáceis de compreensão, pelas pessoas de boa e corajosa fé.

Angela, apesar de achar, como eu, que o mundo vive meio de contra-cabeça acreditava sempre. Deve estar agora ouvindo sua irmã Cristina, junto do Guilherme, contar as novidades do que tem feito. Não duvido muito que tenha pedido papel e caneta e dentro em breve nos mande as notícias.
Como apreciadora das músicas deve estar agora cantarolando “Nada será como antes” do Chico Buarque: Que notícias me dão dos amigos / Que notícias me dão de você / Sei que nada será como está / Amanhã ou depois de amanhã... Ou ainda, do mais moderno do Jota Quest, “Qualquer dia destes”: Quando esse dia chegar, enfim / Cê vai lembrar da gente / E eu vou tá bem longe daqui / Mas até lá / Eu vou ficar aqui, yeah!... Fique com Deus Angela, e, até qualquer hora!

PS.: Publicado na Folha da Manhã em 16 de Fevereiro de 2007.

09 fevereiro 2007

Parem de falar mal da política!

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail:moraes@fmanha.com.br

Tenho evitado palestras, seminários, audiências, reuniões, etc. Já disse, tirando o blog e as aulas que sou obrigado pelo ganha-pão e pela, satisfação que ainda sinto, tudo o mais, estou dispensando. Mesmo com proposta de viagem. Para estas coisas estou de licença sabática. Não sabe o que é? Procure no Google. Deve ser isto mesmo que está por lá.

Pois, então, em setembro do ano passado fui convidado pela amiga e professora, Tânia Vasconcelos, para falar para umas turmas numa escola de EJA, na rua Formosa (melhor nome que o oficial). Sabe o que é? Não vou mandar você procurar no Google, porque, senão, eu é que sei, onde vou parar. EJA significa: Educação para Jovens e Adultos. Algo parecido, porém, mais elaborado, do que aquilo que antes era chamado de Supletivo.

Clientela básica, pessoal da periferia, misturando como identifica o nome: jovens e adultos, alguns até bastante maduros. Antes de começar, ao ver aqueles rostos, fiquei a imaginar seus anseios, suas expectativas mais remotas. O tema era cidadania. Menos de uma semana antes da eleição, não podia, deixar de misturar os canais, que por natureza, já são misturados.

Gostei. Uma mistura, como estamos vendo acontecer em toda a sociedade de crentes e descrentes no futuro e uma maioria desacreditada da política em todo e qualquer nível. Tentei falar sobre a relação entre o esforço individual de cada um de nós, para ascender socialmente e a necessidade de atuarmos coletivamente em pequenos e grandes grupos, em associações, clubes, igrejas, partido, etc. para encaminharmos propostas, fazer reivindicações e pressões.

Falei do complemento que isto deve ter, em relação ao nosso papel de escolher, vigiar, e pressionar também os representantes escolhidos para os três níveis de poder. Aí a descrença é geral. Muitos não acreditam que isso seja possível, embora citem exemplos diversos, de soluções conquistadas a fórceps em e para, suas áreas.

Interessante ver o descrédito da política partidária mesmo com a proposta da fiscalização, do controle e da pressão. A maioria não consegue ainda identificar que a política é muito mais importante para as classes mais baixas, do que para as elites, embora ambas, desdenhem os políticos, com uma exceção: na área dos royalties. Aqui riqueza tem sido sinônima de política e vice-versa.

Acho que poucos - não falo, do público do bate-papo, mas no geral – enxergam o prejuízo que se está trazendo à nação, só falando mal da política. Por tudo isso, plagiando o nome de uma peça da excepcional, Elisa Lucinda, que diz: parem de falar mal da rotina, eu digo: parem de falar mal da política! Mas, por favor, não deixem os políticos à vontade. Vigiem, gritem, proponham, forcem a barra e acreditem: as coisas podem ser melhores!

Publicado na Folha da Manhã em 09-02-07

02 fevereiro 2007

O caldo de pedra

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes@fmanha.com.br

Um frade andava no peditório; chegou à porta um lavrador, mas não lhe quiseram aí dar nada. O frade estava a cair com fome, e disse:
- Vou ver se faço um caldinho de pedra.
E pegou numa pedra do chão, sacudiu-lhe a terá e pôs-se a olhar para ela para ver se era boa para fazer um caldo. A gente da casa pôs-se a rir do frade e daquela lembrança. Diz o frade:
- Então nunca comeram caldo de pedra? Só lhes digo que é uma coisa muito boa.
Responderam-lhe:
- Sempre queremos ver isso.
Foi o que o frade quis ouvir. Depois de ter lavado a pedra, disse:
- Se me emprestarem aí um pouquinho.
Deram-lhe uma panela de barro. Ele encheu-a de água e deitou-lhe a pedra dentro:
- Agora se me deixassem estar a panelinha aí ao pé das brasas.
Deixaram. Assim que a panela começou a chiar, disse ele:
- Com um bocadinho de unto. Ferveu, ferveu, e a gente da casa pasmada para o que via. Diz o frade, provando o caldo:
- Está um bocadinho insosso; bem precisa de uma pedrinha de sal.
Também lhe deram o sal. Temperou, provou, e disse:
- Agora é que com uns olhinhos de couve ficava que os anjos o comeriam.
A dona da casa foi à horta e trouxe-lhe duas couves tenras. O frade limpou-as e ripou-as com os dedos, deitando as folhas na panela.
Quando os olhos já estavam aferventados, disse o frade:
- Aí, um naquinho de chouriço é que lhe dava uma graça...
Trouxeram-lhe um pedaço de chouriço; ele botou-o à panela, e enquanto se cozia tirou do alforje pão e arranjou-se para comer com vagar. O caldo cheirava que ra um regado. Comeu e lambeu o beiço; depois de despejada a panela, ficou com a pedra no fundo; a gente da casa, que estava com olhos nele, perguntou-lhe:
- Ó senhor frade, então a pedra?
Respondeu o frade:
- A pedra lavo-a e levo-a comigo outra vez.
E assim comeu onde não lhe queriam dar nada.

O texto acima é um conto popular português e faz parte do interessante livro editado pela Ediouro: “Os Grandes Contos Populares do Mundo” organizado pelo escritor Flávio Moreira da Costa.

Apesar de poder parecer contraditório, julgo-o apropriado, para aqueles que vivem na abastança, onde comida e royalties não faltam. Dizem que é na fartura que se deve pensar na carência. Vivemos um período momentâneo de dificuldades.

Há pessoas que há quase um mês estão fora de suas singelas moradias, enquanto há outras, que choram pela produção devorada pela força das águas. Meu parceiro Nelson Bagueira que mantém distância relativa das coisas religiosas, não aceita a idéia de um Deus castigador que os igrejeiros tanto gostam de anunciar. Tendo a ficar com a sua visão. Talvez sejamos nós mesmos aqueles, que ainda farão muitos a apreciarem o caldo de pedra. Pense nisto, cate sua pedra e que Deus no livre e guarde!

Publicado na Folha da Manhã em 2 de Fevereiro de 2007.