30 setembro 2007

A verba de Azevedo Cruz teria hoje outros significados?

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes.rol@terra.com.br

Tenho uma certa implicância com algumas partes do nosso tão glorificado hino “Amantia Verba” de Azevedo Cruz. Há algum tempo saí do desconhecimento da sua existência, para o espanto com a exuberância do seu formalismo. Neste processo surgiu o aprendizado de que o título dos versos, que forjaram nosso hino, traduzido do latim, significava “palavras amantes ou amáveis”.

Na verdade não vi amabilidade ao ler que “os teus vassalos vêm beijar-te os pés”. Ao invés de lisonja ao território, senti uma tentativa de preponderância de um povo em relação aos demais.

Imbuído desta reflexão em momento que relia outros escritos, este articulista descobriu, que apenas, no direito penal moderno, a individualização das penas, substituiu a idéia da antiga legislação que previa o castigo dos descendentes, pelos erros de seus percussores.

Neste processo, surgiu de forma quase natural, a idéia de que no presente momento, pode-se de forma involuntária, estar retomando, o direito penal de épocas passadas, ao condenar as gerações futuras, a viverem com as sobras da abastança atual que resulta da generosa receita dos royalties.

A exemplo dos idos da idade média, estaria a geração atual condenando seus herdeiros, a pagarem pelo mal hoje praticado, mesmo que inadvertidamente, pela eleição de representantes que desdenham a vontade daqueles que os elegem?

Haveria explicação para o fato na lei dos homens, ou mesmo, na legislação divina que pudesse explicar os motivos desta geração, ter direitos que nem os do passado e nem aqueles do futuro terão como usufruir?

Os técnicos mais refinados têm considerado o petróleo como uma riqueza que deveria prever, para uma verdadeira justiça do seu usufruto, uma perspectiva semelhante a do tempo de sua criação. Na ânsia de se promover a justiça – se é que é possível exigi-la em meio ao emaranhado de confusões que se vive – não seria mais correto buscar uma utilização, à semelhança da produção desta riqueza, com uma concepção inter-geracional?

Por quê, você que lê este articulista, teria o direito de utilizar, neste período que pode oscilar entre 20 a 30 anos, um bem, que por milhares de anos esteve lá nas profundezas de um mar e que sequer foi lembrado por Azevedo Cruz, quando em 1901 escreveu o nosso Amantia Verba? Cruz falou da Campos Formosa no plaino goitacás, na terra feita de luz e madrigais e morreu, sem poder usufruir de uma riqueza que sequer sabia que ainda estava sendo gerada.

As Marias e os Joões que acabam de nascer não terão acesso aos regalos do presente e, tomara Deus, que não tenham que se sujeitar como vassalos, a beijar os pés daqueles que souberam viver nos dias atuais, com menos recursos, energia, corrupção e mais dignidade.

Publicado na Folha da Manhã em 28 de setembro de 2007.

21 setembro 2007

Citação infeliz em conversa de vendedor

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail:
moraes.rol@terra.com.br

O presidente Lula, no seu elogiável trabalho de mascate vendendo mundo afora nossas potencialidades, agora, especialmente, o etanol e os bio-combustíveis, acabou pisando na bola no quando na Espanha, ao rebater as críticas sobre as condições de trabalho no setor canavieiro, disse: “Será que o corte de cana-de-açúcar é mais penoso do que trabalhar numa mina de carvão? E por quantas décadas, ou por quantos séculos, o carvão determinou a economia do mundo?”

Não dá para justificar uma coisa com outra. É inaceitável que condições de trabalho, quase escravocratas de séculos atrás, sejam reproduzidas hoje, em qualquer situação. Ano passado pelo menos quinze trabalhadores morreram, apenas em São Paulo, por causas não determinadas.

Pesquisadores-médicos do Hospital das Clínicas estão investigando a suspeita de que a causa principal tenha sido, a exaustão causada pelo exagerado esforço físico no corte de cana.

Fora isso, ainda há inúmeros casos de canavieiros trabalhando de forma clandestina, sem carteira assinada, sem segurança, sem o uso de EPIs, etc. Correto e bom que queiramos vender nosso etanol lá fora. Que briguemos para reduzir as taxas de importação hoje cobradas pelos países desenvolvidos, mas não podemos deixar de exigir, a melhoria das condições de trabalho do canavieiro, que ainda são precaríssimas, na maioria das regiões produtoras do nosso país.

É inaceitável que a remuneração seja também tão baixa, em torno de 1/3 de R$ 0,01 por golpe de facão. Até uma década atrás, o bóia-fria cortava entre 4 a 6 toneladas de cana por dia. Hoje, este número, considerado mínimo, oscila em torno de doze toneladas cortadas diariamente.

O presidente é bem intencionado quando quer vender nosso país lá fora. É também compreensível, que ele queira fugir das artimanhas que o mercado global arruma, para impor barreiras alfandegárias, sanitárias e até de uma falsa preocupação com o meio ambiente e com a saúde do nosso trabalhador.

Porém, em troca de ganhos de capital para nossos produtores e industriais, não se pode deixar que condições de trabalho e de ganho dos trabalhadores sejam equivalentes àquelas vivenciadas há mais de um século por mineiros. Isto não pode ser considerado natural.

Avancemos sim, no plantio controlado ambientalmente da cana, no comércio internacional do etanol e dos bio-combustíveis, mas, não deixemos, os trabalhadores sofrerem as conseqüências de uma produção barata e exploradora como faz a China. Tenho certeza que com a origem de vida do nosso presidente, sua fala não deve ter sido, nada além, de uma conversa de vendedor.

Publicado na Folha da Manhã em 21 de setembro de 2007.

14 setembro 2007

Golpe ou blefe de mestre?

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail:
moraes.rol@terra.com.br

Ninguém em sã consciência e responsabilidade poderá afirmar tratar-se de um ou outro. Porém, ninguém pode negar que o governador Sérgio Cabral, quando aqui esteve para uma nova solenidade de inauguração da ponte estadual acabou saindo das cordas e indo para o meio do ringue, na luta contra a aliança entre Garotinho e César Maia, ao afirmar que renuncia ao mandato de governador para disputar a prefeitura do Rio de Janeiro, se tal aliança vingar.

Golpe ou blefe ninguém ainda poderá dizer, mas a jogada é de mestre. É possível apostar, que nem mesmo o soberbo alcaide carioca poderia esperar, por resposta tão ágil e em estilo xeque-mate como esta. Cabral apenas com este anúncio sinaliza para o presidente Lula, que em nome da boa relação e da lealdade ao presidente está disposto, a qualquer sacrifício, até largar o certo pelo duvidoso, com pouco mais de um ano de governo que teria, em abril do ano que vem, quando terá que renunciar, se pretender levar à cabo a idéia de tentar transformar o blefe em golpe.

O melhor da história é que, na verdade, ele não teria nenhum concorrente forte nesta disputa, o que tornaria o duvidoso, menos duvidoso, embora eleição, seja sempre eleição. Outro ponto positivo que teria neste “sacrifício” é que para muitos analistas é sempre melhor e mais fácil, ser prefeito da cidade maravilhosa, sem as incumbências incômodas da segurança das balas perdidas, do caveirão, etc. e de um orçamento estadual inadequado às demandas dos 92 municípios.

Um problema para Cabral é saber se conseguiria ter maioria no diretório municipal do PMDB, que lhe faltou na votação de segunda-feira, quando o diretório estadual, sob o comando de Garotinho, Picciani e companhia aprovou o acordo com César Maia.

Neste caso, o diretório estadual se pretender intervir no municipal, poderá receber o troco do diretório nacional, que parece disposto a manter a aliança com o PT e sonhar em indicar o candidato da aliança nacional com o PT à presidente da República. Sem trocadilho, quem deve estar rindo de orelha a orelha é o Pezão, o atual vice-governador.

E o alcaide e o ex-governador nisso? As regras do jogo da política ensina que o político deve a todo custo evitar, que o controle da situação saia das suas mãos para as do adversário. Num primeiro cenário, este parece ser, o atual quadro. A bola foi roubada no meio de campo por Cabral, enquanto Maia e Garotinho correm para a defesa. Há risco de gol? Só o tempo e o desenrolar da jogada poderão responder.

A partida ainda está no primeiro tempo, mas há gente comemorando na arquibancada. Para os torcedores que se espantaram com a virilidade da jogadas saibam que tudo isto será “café pequeno”, diante do que aponta o cenário das disputas pelas prefeituras da região.

Publicado na Folha da Manhã em 14 de setembro de 2007.

07 setembro 2007

População e problemas de mais e de menos na região

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes.rol@terra.com.br

O IBGE divulgou no início desta semana, os resultados preliminares da Contagem Populacional realizada este ano, junto com o Censo Agropecuário. Esta contagem difere do Censo porque não foi feita em todas as cidades, apenas naquelas de população inferior a 170 mil habitantes, segundo o censo de 2000. No norte fluminense, só Campos ficou de fora.

Alguns dados confirmaram estimativas já conhecidas. Os municípios pequenos que não recebem royalties como produtores tiveram suas populações estabilizadas com ligeiro crescimento ou declínio. Dois deles perderam população: Cardoso Moreira com menos 422 habitantes teve sua população reduzida de 12.579 em 2000, para 12.157 habitantes em 2007 e São Fidélis com menos 305 habitantes caiu de 36.774 em 2000, para 36.469 habitantes, agora em 2007.

O êxodo nestas e noutras cidades da região é facilmente explicado, pela absorção de gente nas cidades litorâneas que têm gordas fatias de royalties. É possível até afirmar, a existência de fluxo populacional entre elas, devido à atração gerada, pelo emprego e melhores condições de vida.

Também chama atenção a situação de Rio das Ostras, que teve sua população aumentada em 90%, em apenas sete anos. Município vizinho de Macaé e ex-distrito de Casimiro de Abreu Rio das Ostras tinha 36.769 habitantes em 2000 e 70.095 em 2007. O segundo maior aumento percentual de população entre as cidades da Baixada Litorânea e do Norte Fluminense foi de Búzios com 27,6%: 18.179 habitantes em 2000 e 23.208 em 2007. Entre os municípios produtores de petróleo de nossa região, São João da Barra teve o menor crescimento populacional.

Bom também destacar que não há nada a ser comemorado pelos municípios que apresentam maior número de habitantes. Alguns prefeitos gostam de expor estes números como se fossem feitos de suas administrações, mas reclamam da quantidade de gente que vem lhe pedir emprego, casa, escola, hospital, etc. Esta contradição no fundo é política e cada um a explora conforme suas conveniências. A única vantagem é a elevação dos repasses governamentais baseados na população.

Na verdade, quanto mais gente, mais necessidade de leitos hospitalares, escolas, casas, saneamento, etc. O tamanho da população não pode ser visto, como às vezes aparece na mídia, como um campeonato, embora seja natural diagnosticar que o crescimento da população tem relação direta com o desenvolvimento econômico, porque onde há emprego há fluxos de pessoas.

Sendo assim, é possível diagnosticar que a cadeia produtiva do petróleo continua sendo a mola mestra do desenvolvimento econômico regional. Isto reforça a idéia repetida, e, talvez ainda não praticada, da necessidade de planejar o desenvolvimento para a era pós-petróleo. Neste aspecto, este articulista considera que nada há para comemorar e muito existe para se preocupar.

Publicado na Folha da Manhã em 07 de setembro de 2007.