A crença na democracia
Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes@fmanha.com.br
Uma coincidência. Num mesmo dia, o hábil jornalista Alexandre Bastos me liga para saber minha opinião sobre a política nacional ao se completar um ano da crise do “mensalão”. Menos de duas horas depois, a amiga Lígia me indagava sobre a situação política no país dizendo-se desorientada depois de tantas denúncias e problemas.
Parecia combinação. Falei para o Alexandre que ele sempre me fazia perguntas difíceis, da mesma forma que falei para Lígia que isso demandava conversa mais longa, porém, a ambos argumentei que a política é muito mais complexa do que imaginávamos até algum tempo atrás.
Nunca me esqueci de uma frase, atribuída ao ex-presidente José Sarney, que ao ser entrevistado disse que na sua terra a política era simples, ou, se está a favor, ou, se está contra. Não sei exatamente porque me lembro disso toda vez que ouço falar na velha rixa e no alto grau de disputa na política de São João da Barra.
Quem começou como eu a pensar e viver a política, a partir dos movimentos de esquerda que faziam oposição ao regime militar, acabou por incorporar ao seu cotidiano, certezas tão frágeis quanto o vaso de cerâmica alocado na janela do gestor de plantão. Os aprofundamentos destas certezas coincidiram com o desabrochar das dúvidas que hoje começam a dar sustentação à maior convicção que todo este processo gerou: a de que a democracia é o bem maior a ser preservado.
Tenho hoje uma clareza, tal qual o vício das clarividências do passado, que me aponta para o equívoco de se crer que os aliados são puros, éticos e competentes, na mesma proporção das impurezas, das desonestidades e das incompetências dos nossos adversários.
A análise mais acurada do presente não pode me impedir de enxergar as falsas virgens que tentam se gabar em meio à farra de um prostíbulo repleto de maracutaias. A sociedade, mesmo que parcimoniosa e quase silenciosa, está mais exigente. A ausência de uma campanha mais deslavada nas ruas a pouco mais de quatro meses da eleição, talvez seja esta pequena demonstração.
Por outro lado, julgo também que a classe média tem que sair do casulo em que se meteu como forma de se reafirmar pura e se apresentar ao mundo sustentando a tese de que, fora da política e da democracia não há salvação. Alguns ainda crêem que a corrupção possa ser evitada com um governo que não dependa do acordo no legislativo.
Estou convencido do inverso, só o contraditório, a fiscalização, o debate, enfim, a democracia poderá de forma efetiva controlar e melhorar nossos governos. Não falo de purificação porque venho aprendendo com a análise cotidiana que o desejo de aperfeiçoamento pode ser tão revolucionário quanto o tiro das falsas e hipócritas certezas.
Publicado na Folha da Manhã de 26 de maio de 2006.
Professor do Cefet Campos
e-mail: moraes@fmanha.com.br
Uma coincidência. Num mesmo dia, o hábil jornalista Alexandre Bastos me liga para saber minha opinião sobre a política nacional ao se completar um ano da crise do “mensalão”. Menos de duas horas depois, a amiga Lígia me indagava sobre a situação política no país dizendo-se desorientada depois de tantas denúncias e problemas.
Parecia combinação. Falei para o Alexandre que ele sempre me fazia perguntas difíceis, da mesma forma que falei para Lígia que isso demandava conversa mais longa, porém, a ambos argumentei que a política é muito mais complexa do que imaginávamos até algum tempo atrás.
Nunca me esqueci de uma frase, atribuída ao ex-presidente José Sarney, que ao ser entrevistado disse que na sua terra a política era simples, ou, se está a favor, ou, se está contra. Não sei exatamente porque me lembro disso toda vez que ouço falar na velha rixa e no alto grau de disputa na política de São João da Barra.
Quem começou como eu a pensar e viver a política, a partir dos movimentos de esquerda que faziam oposição ao regime militar, acabou por incorporar ao seu cotidiano, certezas tão frágeis quanto o vaso de cerâmica alocado na janela do gestor de plantão. Os aprofundamentos destas certezas coincidiram com o desabrochar das dúvidas que hoje começam a dar sustentação à maior convicção que todo este processo gerou: a de que a democracia é o bem maior a ser preservado.
Tenho hoje uma clareza, tal qual o vício das clarividências do passado, que me aponta para o equívoco de se crer que os aliados são puros, éticos e competentes, na mesma proporção das impurezas, das desonestidades e das incompetências dos nossos adversários.
A análise mais acurada do presente não pode me impedir de enxergar as falsas virgens que tentam se gabar em meio à farra de um prostíbulo repleto de maracutaias. A sociedade, mesmo que parcimoniosa e quase silenciosa, está mais exigente. A ausência de uma campanha mais deslavada nas ruas a pouco mais de quatro meses da eleição, talvez seja esta pequena demonstração.
Por outro lado, julgo também que a classe média tem que sair do casulo em que se meteu como forma de se reafirmar pura e se apresentar ao mundo sustentando a tese de que, fora da política e da democracia não há salvação. Alguns ainda crêem que a corrupção possa ser evitada com um governo que não dependa do acordo no legislativo.
Estou convencido do inverso, só o contraditório, a fiscalização, o debate, enfim, a democracia poderá de forma efetiva controlar e melhorar nossos governos. Não falo de purificação porque venho aprendendo com a análise cotidiana que o desejo de aperfeiçoamento pode ser tão revolucionário quanto o tiro das falsas e hipócritas certezas.
Publicado na Folha da Manhã de 26 de maio de 2006.
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home