07 agosto 2006

Para que tanta ambulância?

Roberto Moraes Pessanha
Professor do Cefet Campos
e-mail:moraes@fmanha.com.br

Muito se tem falado sobre a corrupção das sanguessugas. Bom que se apure todo o esquema e também os responsáveis pelo escândalo em que parlamentares, autores de emendas ao Orçamento da União, são suspeitos de terem recebido dinheiro ou extraído vantagens, pela venda superfaturada de ambulâncias a prefeituras com o dinheiro público obtido nestas emendas. Porém, ainda não vi e nem li, nenhum comentário questionando o por quê da necessidade de tantas ambulâncias.

Em nosso país, há algum tempo se passou a confundir saúde com transporte de doentes. O esquema que começou com político se elegendo através do transporte de eleitores-doentes ou doentes-eleitores, passou para a gestão pública de forma cada vez mais intensa.

Certa vez ouvi de uma fonte de credibilidade, a informação de que Porto Alegre mesmo sendo uma metrópole que tinha seus problemas de gestão de saúde pública razoavelmente bem administrados, possuía apenas quinze ambulâncias que davam conta da demanda local. Para se ter uma idéia da discrepância, em Campos, só a prefeitura, já chegou a ter quase cem ambulâncias.

Não é difícil entender que em municípios pequenos, a principal solução que seus prefeitos adotam na área de saúde é o de transportá-los até aos hospitais e clínicas das cidades maiores. Porém, ao inverso, torna-se incompreensível que nestas cidades, mesmo, mais adensadas populacionalmente, se possua tanta necessidade de transporte de doentes.

Pergunto: quem nunca presenciou, nas primeiras horas da manhã, nas redondezas do nosso mercado municipal, ambulâncias de diversas localidades do nosso interior, desembarcar “falsos doentes” que serelepes saem a caminhar aceleradamente em busca do comércio? Não seria nenhum exagero dizer que, em muitos casos, estes veículos estão mais para táxis do que para ambulâncias.

Os gastos extras bancados pelo “erário público” por conta desta farra, não se restringem aos gastos com combustíveis. Vai muito além. Cada ambulância tem pelo menos três motoristas. A manutenção dos carros envolve custos consideráveis com lavagem, consertos, reposição de peças e toda uma estrutura de gestão que envolve chefes, subchefes, aspones, etc. As despesas com estas estruturas são cada vez maiores e com isso, o objeto da sua original necessidade que é a saúde do cidadão, acaba ficando pelo caminho.

O governo federal tem ou tinha um programa interessante que exigia o deslocamento de profissionais da saúde para o atendimento de doentes crônicos, no próprio domicílio, com a finalidade de reduzir a superlotação das emergências. Este tipo de programa exige transporte de especialistas, mas não de ambulâncias. Não sei que fim levou, nem este e nem o famoso PSF (Programa de Saúde da Família). Ambos interessantíssimos no papel, mas que parecem sucumbir junto com o barro das periferias das nossas cidades em dia de chuva. Se estivessem funcionando razoavelmente, tenderiam também a reduzir as demandas por estas ambulâncias. Porém, parece mais que nunca estar em vigência a política que determina a criação de dificuldades para a venda de facilidades. Encerro voltando ao ponto inicial: será mesmo necessária tanta ambulância?

Publicado na Folha da Manhã de 4 de agosto de 2006.